sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Pra sempre meu amigo

Giovana Damaceno

Hoje ele se foi. Depois de 14 anos de vida em comum, parte do que vivi durante todo esse tempo se foi, num suspiro sofrido, no meu colo. Oito quilos e meio cobertos de pêlos negros, já salpicados de fios brancos que a velhice tratou de descolorir. Meu grande amigo, velho amigão. Creio que nos últimos anos foi realmente o único que viveu comigo as maiores alegrias e as mais amargas derrotas. Viu e ouviu meu choro, meus grunhidos de desespero, me olhava atento, fixo nos olhos, quando conversava com ele, ficava triste quando eu ficava triste. Me fez companhia naqueles momentos de solidão que só nós dois sabemos, porque sentimos juntos, nos cômodos do apartamento, na varanda, embaixo do tanque, na casinha de madeira, na porta da cozinha. Eu chamava, ele atendia; não chamava, e ele sentia mesmo assim, que precisava dele. Quando eu saía, não continha o medo de que eu não voltasse mais e gritava no portão. E quando eu chegava em casa era festa, aquela felicidade saltitante, corridas pela casa, latidos, ou às vezes choro, por me ver de volta. Só quem conhece, viveu ou vive amizade assim, sincera, pode entender. Amizade com base em amor mesmo, verdadeiro, incontestável, profundo, como de almas irmãs. Meu preto, meu crioulo, meu negão, hoje não saltitou quando abri a porta da casa de manhã. Não veio correndo abanar o rabo de bom dia. Fiquei triste, quando te vi triste. Meu dia desmoronou, quando o vi caído, sem forças. E nada me consola, desde que sua cabeça pendeu nos meus braços e de seu peito senti o respiro final. Não contenho o choro, desde o momento em que o deixei para trás, em companhia das árvores. Ficou lá um pedaço da minha vida, a minha dedicação, meus maiores segredos que só a ele confessei. Obrigada, meu amigo, por todas as gargalhadas que me tirou da garganta, pelo conforto ao chegar em casa e ser recebida por você. Por ter me ensinado a cuidar, desobrigadamente, a entender que você entende, a sentir que você também sente. Sinto sua falta. Desde sempre.

2 comentários:

Anônimo disse...

ai, Giovana... me acredite numa dor dividida..putz..chorei como uma pessoa amante de sua cachorra. sim, eu tenho uma cachorrinha que deixo aos cuidados de meu pai, porque esse meu ir e vir entre as regiões geopolíticas do Brasil não permite o companheirismo.

"Por ter me ensinado a cuidar, desobrigadamente, a entender que você entende, a sentir que você também sente."

foi a parte mais tocante, se é que posso desfragmentar o texto, mas.. toda a sorte no mundo nessa caminhada que se prossegue.

Simone Couto disse...

sinto muito, pela sua dor. o amor não vê raça, verdade maior.

bj, simone